quinta-feira, 30 de junho de 2011

Suplica


O corpo marcado

pelo seu ferrão

não perde a memória


Como esquecê-lo?


A frouxidão

o abismo

o sempre inesperado

susto

-alivio da agonia-


Não pode ficar tanto tempo

longe!

segunda-feira, 27 de junho de 2011

sem título

há no mundo um mundo
medra imerso em medo
agora
que voltei da volta ao mundo
minto
revolto ensombrado durmo
bruma adentro
de meias

entretanto movimento a mente estaca
entre
tempo entrante de mor
sorte ânsia & espanto
enfim um mar
a que sempre (diminuto)
volto

porque não vento nem chovo
de fato
nunca imerso impenso
desperto
o amor que o tempo des
dobra

dou de ombros consulto
oráculos
de fora a fora finjo
fujo da obra inverso
semi névoo sem tamanho nem
tento

mas sigo ainda sendo
cego
ovas mortas escutando
junto
ao muro olhos de pano
apostos atento a
mirarte

pois que um mundo tão
sem vôo
vou em frente enfrento
ar
onde ondas ondeiam e o mar sempre
volta

domingo, 26 de junho de 2011

O que não tem fronteiras


Há alguns milênios hominídeos saíram do vale do Rift na África, provavelmente movidos pela fome e foram andando por esse mundo sem saber o que teriam pela frente. Muitos ficaram pelo caminho, alguns foram encontrando abrigo e alimento e ao que tudo indica outros companheiros. São nossos ancestrais. Sabemos muito pouco sobre antepassados e isso ajuda muita gente pensar que não tem nada a ver com eles. São os que se julgam diferentes e/ou especiais no que diz respeito a sua origem e a sua importância na escala (esta palavra já dá uma idéia de ascensão) evolutiva.

Bem, eu sou brasileira e ser brasileira significa no meu caso ser metade italiana e metade... aí começa. Tem os índios que habitavam essas terras e os portugueses que por aqui chegaram e que por aqui ficaram por muito tempo. Isolados alguns se misturaram com as varias tribos, já havia por aqui alguns poucos europeus e depois por cá aportaram franceses, holandeses e a mistura continuou (sabemos que muitos portugueses já traziam suas misturas com mouros, romanos, etc.) Trouxeram os negros, vieram ingleses, dinamarqueses. Devo ter um pouco de quase todos, assim como a maioria dos brasileiros.

Com um pouco mais desse ou daquele temos gente de varias cores, larguras e tamanhos em inúmeras combinações, algumas especiais outras não tão felizes. Isto é um sangue brasileiro, uma salada das mais variadas, cheia de formas, cores e cheiros.

Acontece a mim, de algum sabor ser conhecido sem nunca ter sido provado, ter saudades desconhecidas e coisas do gênero. Atavismos quem sabe? Gosto deste mosaico que me compõe. Não entendo o desejo de alguns de só ter uma origem, a raça pura, sem mistura. Além de triste é monótono. Não usufruem essa variedade e nem a alegria de ter um baile nas veias cheio de gente dançando.


domingo, 19 de junho de 2011

Ratazanas Humanas


Momentos de tremor.




Onze horas da noite. Decidimos não ir à Festa do Boi no Morro do Querosene. Dormimos.



Um barulho na casa ao lado, que está vazia há anos. Subo à laje e espero os olhos se acostumarem ao escuro.



Duas ratazanas humanas, esguias e ágeis, tentando pular o muro do jardim da minha casa.



Naquele ponto o alfeneiro do lado de cá se apóia na goiabeira do quintal do falecido vizinho. Um muro, uma tela e uma cerca viva de cafezeiros e sete-léguas dividem as casas.



Gritei feito louco lá de cima. As ratazanas escaparam para a rua pulando o portão da casa abandonada como se ele não existisse.



Sumiram pelas vielas que cortam os longos quarteirões do bairro. A polícia militar chegou em vinte minutos.



Tem acontecido muito na região: invasão de casas, estupros, roleta-russa, enfim, oportunidades únicas de vivenciar em primeira mão um conto de Rubem Braga.



Atenção: isto não é ficção.



É apenas um país que vai pra frente, praticando a justiça dos ricos, empurrando com a barriga o trânsito assassino, varrendo pra baixo do tapete terroristas italianos, deputados procurados pela Interpol, senadores que censuram jornais, sindicatos de ladrões e mafiosos que se tornam patrimônio nacional.



Boa sorte a todos.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Renitente


É claro!

existe essa dor

essa dor

que não cala

essa dor

que não para


Dessa dor

não adianta fugir

fingir que

passou

que ela acabou

de repente ela

grita


E essa dor

sem nenhum respeito

sem consentimento

desavergonhadamente

mostra-se

completamente


E a vida?

a vida fica

fraquinha

é só um fiozinho

enrolado

no fundo do peito.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

VOLTANDO






















Voltando atrás,
bem mais atrás,
onde a memória dolorida ainda alcança

e estar sentada num degrau
olhando o mundo revirado em bois bravios

e o medo,
e o medo,
e o medo,

e o cheiro ruim-gostoso que sai da boiada,

e o corpo nu ralando a pedra
e a boca em gozo arreganhada para os astros,

eu, rodeada de mil vagalumes.








foto: Xilogravura de Fernanda Ozilak

sábado, 11 de junho de 2011

por que se mata o poeta?

Árdua entre as mais tarefas

que impõe a vida continuar

vivo não é fácil e requer

experiência

ninguém pediu para nascer

supostamente

por que então o poeta pede

para sair?

desce do trem e da vida antes

do fim da festa do pôr

do sol do inverno e da

colheita

o estouvado gesto é claro

erro crasso e necessário

a mim a vocês ao camponês

e ao operário

o poeta surfa a onda na velocidade

da luz

um vacilo e ele perde todos os espelhos

torna-se irremediável solitariamente

contrário

tragado pelo caldo primitivo nas entranhas

do Grande Buraco

em 1925 Siérguei Iessiênin corta os pulsos

escreve versos com sangue e

se enforca

grita Maiakovski contra os "versos velhos no velório" do jovem

porque somos chamados a sustentar o corpo imenso

do morto

já que sem poetas estamos um pouco menos

despertos

menos atentos à barulheira que faz a poesia

em nossos sentidos

os suicidas sempre deixam uma mensagem

em código

escrita numa língua antiga e indecifrável

a qual esquecemos

mas que afinal lembramos uma última vez

cedo ou tarde.


segunda-feira, 6 de junho de 2011

Sem Vento Sem Brisa


Não falarei dos sonhos do
amor

Não mostrarei o desejo
nem minha carne
Não tocarei seu corpo
não beijarei sua boca
Esta sina você me deu
A que lhe dou?
Nunca saberá quando morreu
o sentimento

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Dueto ao Entardecer


Como filho de Sara

o amor chega

tardio

depois que a esperança se

foi


Será engano

realidade

ou ilusão


Pouco importa

são dádivas para lembrar

a vida não terminou