NATASHA & PROFESSOR CAMARINHA
20:29
Eléos
e Phóbos, piedade e terror.
Tanto quanto a
tragédia grega encenou os muitos tons e sentidos da dor, a arte cristã se
dedicou a representar a paixão de Cristo, ou seja, a história do martírio: a
dor extrema do Filho de Deus. Purgação e expiação das paixões. Identificação e
compaixão. Paixão mista em que o prazer nasce da contemplação dos limites do
ser humano, da visão terrífica da morte.
Sacrifício
ritual, culto dos mortos, a arte nunca deixou de ser um exorcismo do
incomensurável poder de Tânatos; na arte, reencontramos a dor na sua vertente
sublime, descobrimos que a beleza pode ser terrível. Respeitável pai de
família, pesquisador nível A da Capes e figura de proa da intelligentsia
tupiniquim, o professor Camarinha mantém oculto um lado da sua vida. Ele é um
esteta da dor.
O professor
descobriu o segredo dos torturadores de todos os tempos e lugares.
O
pensamento clássico segrega mente e corpo em universos paralelos; quando
dizemos distraidamente ‘meu nariz’, ou ‘minha perna’, salta aos olhos (e aos
ouvidos) a exterioridade do ‘eu’ que fala na relação com o ‘seu’ corpo. Eu não é um corpo, eu é um outro. Etc., etc..
Ora,
o objetivo primeiro e último de qualquer suplício é devolver este eu onipotente
ao corpo em agonia; derrubar a dignidade da primeira pessoa do singular,
reduzindo-a a um feixe excretor de sensações. Carne e medo.
Prosaico silogismo do carrasco: você é este
corpo, este corpo me pertence; logo, você me pertence. Cequedê. O caroço desta
verdade quebra a espinha ao mais durão dos idealistas. Memento mori pra ninguém
botar defeito.
A
um sujeito destituído em sua palavra, corresponde um corpo despido do seu
próprio controle, que não pertence mais a si mesmo, transformado em objeto nas
mãos perversas de um outro cujo poder não tem limites. Nesta experiência de
ultrapassagem e redenção, de cruzamento de fronteiras e concomitante restabelecimento
de padrões, Natasha é mestra em extorquir dele as verdades recalcadas, em alçá-lo
aos cumes gêmeos do sofrimento gozoso.
O
interfone tocou. Chegara, finalmente. Abriu a porta para ela já vestido com o
pijama de estampas infantis; os membros peludos e a pele do professor
contrastavam com a tez mais clara da careca.
“Hãm,
oi, boa noite, deixe-me ajudar com o casaco... Aii!!”, ainda no vestíbulo, mas
já com a porta fechada, levou a primeira chicotada da noite.
“Quem
deu autorização pra tocar em mim?”, Natasha já tinha incorporado, usava a
máscara da Mulher-Gato, os longos cabelos castanhos a lhe cobrir os ombros.
“Pega a minha mala. Leva pra lá. Só abre quando eu mandar”.
Desfez-se
da capa de vinil sobre uma poltrona. Relanceou os olhos pelas paredes da sala
cobertas por prateleiras de livros. Caixas de som tocavam ‘No Castelo do Rei da
Montanha’ do Peer Gynt. A filmadora a postos sobre um tripé. Conferiu o
enquadramento da câmera na telinha. Perfeito.
“Já
posso abrir?”
“Não
ouviu o que eu falei?”, e, pimba!, sapecou-lhe o reio de novo, nos quartos.
Natasha apercebeu-se satisfeita da ereção que já lhe estufava o pijaminha.
Devidamente
autorizado pela patroa, o escravo pôde, enfim, abrir a maleta, de onde foi
saindo uma cornucópia de couro e metal: correntes, arreios, coleiras, uma
chibata, uma máscara de gás emborrachada, algemas de zamak cromado; e o principal
acessório, o Bernardão.
“Vamos
passear agora”, puxou-o pela coleira, dirigindo-se para a cozinha, “Mas vou
avisando: toda e qualquer desobediência ou mau comportamento serão severamente
castigados. Responde!”, deu-lhe um repelão brutal na coleira.
“S-sim
senhora!”
Natasha
pôs a água para esquentar no microondas. Cinco minutos.
“Ah,
não é possível, babando na minha bota!”, desfechou-lhe uma saraivada de golpes
com o chicote de nove tiras. O servo se contorcia gemendo excitado, acariciava o
membro intumescido.
Levou-o
para a sala aos pontapés.
“Já
pro castigo! Mau, muito mau menino, agora não pode dizer que não avisei... Vira
pra parede, já! Está de castigo até eu mandar!”
“Na-ãao,
o castigo não, perdoa mamãezinha, o castigo não...”
“Você
errou, e sabe que tem de ser punido para o seu próprio bem. Isso dói muito mais
em mim que em você...”, ouviu o sinal do microondas, voltou para a cozinha
arrastando a mala de rodinhas metalizada. As botas de salto alto ressoavam no
assoalho de tábuas corridas.
Natasha
preparou com cuidado o Bernardão: um consolo avantajado, em borracha crua, calibroso,
e equipado de êmbolo. A água deveria estar tépida, nunca quente demais.
“Abaixa
essas calças, pirralho atrevido, chegou a hora do enema! Vamos limpar toda a
sua sujeira, até a de dentro”, ela se movia com os passos elásticos de pantera,
a roupa de suplex delineando a silhueta sinuosa, o ameaçador rabo-de-tatu preso
na cintura.
“Mas...
já? O Bernardão agora não, nem tô com a tripa presa... eu fiz cocô direitinho
como a senhora gosta, por favor, agora não.”
“E
eu te perguntei alguma coisa, moleque?”, Splaat, estalou uma chibatada nas
nádegas do professor. Ajustou algemas nos pulsos e tornozelos dele, arriou a
parte inferior do pijama, untando-lhe o ânus com gel de xilocaína. Introduziu o
dildo cuidadosamente.
“Unff!!
Aiii, pára com isso, não faz isso comigo, assim, hmm... pára...”
“Isso,
este é o meu escravo, assim que eu gosto... vai confessa, fala pra mim todas as
coisas feias que andou fazendo”, a dominatrix esvaziou o êmbolo do Bernardão,
injetando dois litros de soro morno nos intestinos do masoca. Sentia estar se
aproximando de alguma coisa nova com o súdito, um novo limite ia ser quebrado
naquela noite; a excitação que ele apresentava era maior do que o habitual.
Descalçou
as botas. Tirou as meias.
“Hmm,
ai, que duas jóias mais lindas, que dedinhos! Posso...?”, ele pedia, mas já se
atirava sobre os pés da tirana, lambendo-os, sôfrego.
“Você
sabe o preço, né? Sabe ou não sabe? Responde!”
“S-sei sim
senhora”.
“Lambe
primeiro as solas dos meus sapatos, já!”
Chegaram
na parte da cena que Natasha mais gostava.
Calçou as suas
pièces de résistance: sandálias de salto alto; simplesmente duas jeweled-fish
de Giuseppe Zanotti. Usando algemas com afastador, prendeu-o deitado de bruços
a uma coluna da sala. Caminhava sobre as costas do sujeito, perfurando-lhe a
camisa com o salto afiado no calcanhar. Pequenos botões carmim emergiam no
tecido.
Vestiu o rosto
dele com a máscara de gases. A vítima gritava, choramingando palavrões abafados
pelo bocal de borracha amarela.
“Grommfbb, ca,
ca...”
“O que é que
você falou? Mais alto, quero ouvir!”
A hora da
verdade.
A fronteira da
qual recuara até então. Trocou a posição das algemas no poste de suplício,
virou-o de barriga para cima. Era necessário que visse tudo. Afastou as pernas
sobre o peito dele, abriu um zíper no macacão de suplex que atravessava o
cavalo da calça da frente ao cóccix. Concentrou-se. Em breve, um bem formado
tolete se depositava sobre a barriga do escravo.
O professor
Camarinha arquejava em
êxtase. Manchas úmidas se alastravam nos calções do pijama.
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